quinta-feira, 16 de abril de 2009

dez anos do madeirismo

alberto lins caldas


o madeirismo surgiu contra os bairismos, os localismos, os regionalismos, os nacionalismo e, por mais estranho que pareça, contra tudo aquilo que se proclama universal, a europa camuflada, a nação e a mídia adoecedora nas artérias. Essa dimensão fascista dos nacionalismos que tudo infesta, faz calar, faz seguir um molde, um modelo, esse medo de se afastar da manada, do calor do rebanho, de balir todos ao mesmo tempo, cozidos no mesmo calor dominical. o madeirismo colocou outro horizonte, o do enfrentamento desse horror, seja com o silêncio do poema, seja com a alegoria brutal da prosa, seja com a arte que não aceita sua inescapável servidão, seja com uma crítica e uma filosofia em constante guerrilha como a hermenêutica do presente, que lutou contra uma universidade “ninho de ratazanas”.
o manifesto madeirista foi publicado pela primeira vez no jornal “alto madeira”, em 10 de janeiro de 1999, sendo publicado no jornal “o estadão” no dia 24 do mesmo mês, e “nunca antes um artigo ou movimento artístico provocou tanto incômodo e discussão em rondônia”. dez anos depois, com muitas tentativas de puro silenciamento, o “manifesto madeirista” e seu movimento continua em plena criação, discordância, potência, seja com carlos moreira, com sua poética do silêncio, seja com gláucio giordani, e sua música sempre diferente, seja joesér álvarez com seu “coletivo madeirista”, seja comigo mesmo com minha literatura do “enfrentar o horror”, seja com os muitos que sentiram o quanto podiam seguindo essa indicação.
e a “arte rondoniana” jamais poderá ser a mesma, ou melhor, como jamais houve arte entre as minhocas, só podemos falar de arte, de poesia, de literatura, de música, de filosofia, depois do madeirismo: radical? não! infelizmente a mais límpida realidade. só poderão fazer alguma coisa tendo como horizonte o madeirismo, ou continuam com seus ritmos de colonização, com suas formas patéticas, seus giros facistóides. é um horizonte a ser destruído, derrubado, atravessado, mas não um horizonte que se possa retroceder, que se possa voltar. ou se fica no lugar, o que a grande maioria faz por precisa incompetência e servilismo; ou se sai dele, atravessando por muitos outros horizontes em transversais.
nesses dez anos muito foi feito por nós quatro (alberto, carlos, joesér, gláucio). obras de todos os tipos que confirmam o proposto, o apontado no manifesto. ganhamos muitos inimigos e muitos amigos, além de uma multidão de indiferentes expectadores. conseguimos o principal, um domínio cosmopolita, livre, aberto e múltiplo, contra o horror que nos estrangula. como balanço de dez anos as obras criadas e expostas são a resposta mais que contundente de um movimento que iniciou com um pequeno manifesto, mas grande em suas pretensões. estamos compondo essas promessas. quem não for mineral nem vegetal, basta abrir o corpo para perceber o quanto foi feito de tão pouco. e isso ainda não é suficiente. restam ainda os vinte, os trinta, os quarenta, os cinqüenta anos do “manifesto madeirista” com sua ironia central. sem nós, espero, porque precisamos descansar, mas outros virão.
cadê a tua voz?

sábado, 4 de abril de 2009

liberdade de expressão e fascismo regionalista

alberto lins caldas

não temos o “costume” da liberdade ou da liberdade de expressão. ao primeiro riscar do cheiro de pólvora linchamos o monstro q ousou se “expressar”. não há crime maior. dizer o pensa, o q sente, o q deseja, o q vê, o q imagina, principalmente quando discorda do q acreditamos ou vivemos, só pode ser um crime, e o infeliz q ousou dizer algo contra nossa maneira de ser e de estar, um criminoso. isso não passa de fascismo, mas está inclusive na lei: podemos ser processados por “apologia ao crime”: esse é um crime q ninguém nota. por uma coisa muito simples: uma lei fascista num mundo fascista não pode ser entendida como fascista.
quando o regionalismo, o localismo, os nacionalismos se juntam, se articulam pra manter um fascismo legislativo, judiciário, governamental, local ou nacional, um fascismo dos costumes, entramos num momento perigoso, ou nunca saímos desse momento sempre a ponto de linchar alguém, ou de silenciar por todos os meios legais, amigos, passionais, administrativos, afetuosos, e violentos, traumáticos, tortuosos.
escrever sobre sua cidade, seu bairro, seu estado, seu país, escrever qualquer coisa, deve e pode ser suportado enquanto idéia, opinião, perspectiva, sem q o criminoso seja destroçado, expulso, violentado, massacrado. basta q respondamos as suas palavras, suas opiniões, sem tocar no seu salário, na sua vida, no seu corpo, na sua paz, nas suas relações vitais. mas não conseguimos conter o ódio carniceiro diante da diferença, diante do outro q se expressa, estranhamente, como outro. e todos são democratas! imagine se todos se considerassem do partido nacional socialista: todas a diferença iria, depois dos campos de extermínio, pros campos do esquecimento. e todos muito felizes ficariam bebendo sua cerveja bem gelada, coçando o bucho e conversando sobre “futebol e mulher”, contando piadas sempre preconceituosas e uns rindo com os outros como cordeiros perversos, vendo lá longe a fumaça dos crematórios.
e há sempre de tempos em tempos alguém q diz o q pensa, mesmo q seja infantil ou primitivo, seja inofensivo: quanto mais inofensivo mais ofensivo se torna: quem escreveu sendo inofensivo mostra q é fraco: chama os carniceiros de plantão, as milícias do bom pensar, os guardiões dos bons costumes, os servidores da lei.
não se sabe bem porq, mas de repente alguém diz o q pensa, escreve, canta, grita, delira, poetiza, goza o q pensa. e o mundinho vem a baixo. a democracia vem a baixo. e vemos quão pouco suportamos a diferença q se mantém diferente, o diferente q diz o q pensa. vemos até onde vai nossa democracia criada e mantida nas portas dos governos, nos sensos comuns, nos capachismos, nas vergonhas de fugir das manadas, se mantém na plena e dura burrice em suportar a diferença.
seja cantar uma letra de música idiota de algum estado ou da-nação conforme deseja, seja atacar o horror de uma cidade, de um estado, do país; seja atacar uma matilha de ratazanas q dilapidam uma universidade; seja criar um movimento artístico maior q o universo minúsculo de minhocas histéricas. só podemos cantar o de sempre, só podemos ser igual aos outros, só podemos viver a vida de todos.
a resposta à diferença é sempre estridente, sádica, cheia de frases feitas, imagens feitas, gestos feitos, pré-feitos, onde todos podem beber sem se embriagar, onde a verdade fica a disposição da anta, do burro, do jegue, do animal de plantão (não confundir com o “animal de platão”). e o pobre diabo é escorraçado sem a piedade dos religiosos, q os religiosos gritam q possuem às toneladas, q os democratas gritam q possuem o tempo inteiro, q a “população em geral” se orgulha o tempo inteiro, enquanto alguém não se põe a ser diferente, dizer a diferença. e o medo á diferença é simples e elementar: a diferença faz aparecer a mesmidade, a falsa igualdade, a mentirosa fraternidade, a amarga mentira da amizade, do amor, do carinho, da cumplicidade, do companheirismo: a diferença além de mostrar q o “rei ta nu”, mostra q a “população em geral” e a “intelectualidade local” não passa de uma massa fascista, perigosa, burra, doente e ressentida.
se não fosse o diferente, o estranho, o contra, jamais saberíamos quem é um crápula, um nazista, um covarde, um regionalista estéril, um nacionalista de carteirinha com saudade das ditaduras. pra isso temos q reconhecer a função do diferente: expõe o quanto são pulhas as massas midiáticas, os batráquios metidos a artista, os jabutis travestidos de intelectuais, as ratazanas universitárias, as antas vestidas de professores.
esse diferente pode ser alguns q conhecemos muito bem, alguns de nós, ou o último, o “professor nazareno”. tanto faz a quantidade da diferença, a questão está na quantidade da igualdade. na força desproporcional entre o diferente e as matilhas, os cardumes, as manadas nazi-fascistas sobre o in-feliz da vez. mas o infeliz da vez é sempre mais alguém, sempre outro q escapa ao campo de força da rocha irremovível da mediocridade.